Voltei.
Considerando o número de pessoas que não conseguiram chegar em 2021 só por causa do mais novo vírus que nos assombra, voltei agradecida. Mais do que nunca. Nunca uma virada de ano foi tão comemorada. Desde março do ano passado o que mais falei para meus filhos, parentes e amigos foi: o importante é chegarmos vivos ao final do ano, minimamente sãos, física e mentalmente. O resto a gente resolve depois.
E chegamos.
Bebi um pouco e dancei muito entre as últimas horas de 2020 e as primeiras de 2021. Sozinha mesmo. Na sala. Fiz minha celebração, ainda que com todo o resto para resolver, tentando fazer com que meus filhos dançassem comigo, o que não consegui. Mas o importante era que eles estavam na sala, ao alcance do meu abraço, e pudemos nos beijar à meia-noite. O que mais desejei para eles e para todos, mais do que nos outros anos, foi saúde. Nunca também fez tanto sentido a famosa frase “o que importa é ter saúde, do resto a gente corre atrás”.
Terminei 2020 com 109 livros lidos. Uma média de dois livros por semana. Um deles com mil páginas. Nunca li tanto. Nunca escrevi tanto “nunca” em um texto só. Porque em 2020 muita coisa que nunca tinha acontecido antes na minha vida, aconteceu. Meu pai, que nem gripado eu tinha visto, em um entra e sai de hospitais. Minha mãe com passos lentos e olhar cansado. Meu braço direito paralisado de dor. Eu na cozinha fazendo comida. Meu marido em casa em uma quarta-feira à tarde. Uma tela entre alunos e professores, aniversariantes e convidados, entre amigos e amantes.
Se tudo doeu mais em 2020, todo pequeno ato também foi celebrado. A luz do sol que entra pela janela da sala às quatro da tarde e deixa o chão e os móveis alaranjados. O sono dos gatos nas almofadas durante uma tarde inteira. Uma xícara de café recém passado.
Assim fomos, ato por ato, página por página, passo por passo.
No dia primeiro de janeiro de 2021 meu filho mais velho me chamou no canto: mãe, agora que o ano novo chegou, a gente precisa fazer alguma coisa diferente ou pode continuar vivendo como antes? Ele estava sério. Era mesmo uma dúvida. Havíamos chegado ao ano novo, afinal. Estávamos vivos e saudáveis, meta alcançada. E agora, já que falamos tanto dele?
Agora continuamos, filho, vivendo como sempre vivemos. Tentando ser uma pessoa melhor a cada novo dia, sem deixar de olhar a luz do sol que entra pela janela, sem deixar de agradecer pelos pores do sol, sem esquecer do cafezinho no meio da tarde, sem deixar de chorar quando a garganta apertar muito.
E sem deixar de ler, não é, mãe?
Sempre. Isso sempre, meu filho.
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