Homenagem poética às origens do cinema


Acho que acabo de assistir ao vencedor do Oscar 2012 de Melhor Filme: “A Invenção de Hugo Cabret”, de um Martin Scorsese completamente fora de seu estilo habitual de cinema.

Confesso que, apesar de considerá-lo um mestre nas técnicas cinematográficas, não sou fã da maioria das histórias filmadas pelo diretor dos violentos “Táxi Driver”, “Touro Indomável”“Os Infiltrados”. Concordo que seus filmes figuram entre os melhores já produzidos pela indústria norte-americana, mas, salvo “A Época da Inocência” e “A Ilha do Medo”, os roteiros que filmou antes de “O Aviador” transbordam muito sangue e testosterona para o meu gosto pessoal.

Mas “A Invenção de Hugo Cabret” é diferente de tudo o que o cineasta já fez. Baseado em um livro infantil homônimo, costura uma série de homenagens à história da sétima arte enquanto narra as aventuras de um órfão que vive incógnito dentro do relógio da estação de trem de Paris, na década de 30.

Quando tem seu caderno de anotações roubado pelo dono de uma oficina de brinquedos instalada na estação, Hugo (Asa Butterfield) conhece a neta dele (Chloe Moretz), com quem iniciará uma aventura para solucionar um mistério envolvendo o robô que herdou de seu pai morto e o avô da menina.

É lindo acompanhar o raciocínio infantil – portanto simples e singelo – que leva Hugo a decidir-se por ajudar a “consertar” a vida do papa George (Ben Kingsley, sempre galante), que como um relógio quebrado, amarga a perda de sua função no mundo.

Impossível não se enternecer.

Mas quem ama cinema para além da telona também conseguirá divertir-se identificando referências à sétima arte, como a música do clássico“A Grande Ilusão” (Jean Renoir, 1937) tocando no café da estação e a apropriação de George Meliès – ilusionista que tornou-se um dos precursores dos efeitos especiais nos primórdios do cinema – como um dos personagens-chaves da história.

Em uma sequência, aparecem entre os frequentadores da estação nada menos que o escritor James Joyce, o líder político britânico Winston Churchill e o guitarrista belga Django Reinhardt.

Também uma instituição do cinema, o veteraníssimo ator Christopher Lee faz uma belíssima participação especial como o livreiro Labisse (que timbre magnífico de voz ele continua a ter!).

E a fotografia, belíssima, é um espetáculo à parte.

Enfim, são homenagens demais ao cinema para não derreter os corações dos votantes do Oscar, que obviamente se sentirão tão homenageados quanto, já que são parte desta indústria de sonhos.

Recentemente, li a uma entrevista de Scorsese dizendo que o cinema salvou sua infância solitária, enchendo-a de magia. Identifiquei-me imediatamente! O cinema e os livros também fizeram companhia à minha infância solitária, a ponto d’eu nem perceber que era solitária (só depois de crescida me dei conta… rs). Os filmes fizeram-me companhia até antes dos livros, já que me acompanham desde antes da alfabetização.

Ah e como foi bom viajar nesta arte mágica! Quem tem esta relação com cinema, vai resgatá-la, como eu, assistindo ao filme de Scorsese…