Carta para a Menina Helena

Um dos quadros integrantes da exposição na torre de Lucca, em julho de 2017

A Helena é filha da Marina, que é filha da Sheila, que é irmã da Adriana, e ambas filhas da Maria José.

Uma linhagem de mulheres (fortes!).

A Sheila e a Adriana são peregrinas, gostam de andar pelo mundo. Isso começou em 2014, quando trilharam o Caminho de Santiago e a Helena era ainda uma bebezinha. Não entendia direito de ausências.

Mas o tempo passou – criança cresce rápido – e quando as duas irmãs resolveram trilhar a Via Francígena, em 2017, a menina precisou ser preparada para entender a falta da avó naquela casa sempre tão cheia de Sheila.

Na tarde em que chegamos a Fornovo, a Sheila e a Helena se falaram por Skype. A Sheila disse:

“Olha, Helena, a vovó está te mostrando a paisagem daqui. Tem montanhas, tem ovelhinas lá embaixo. Já já a vovó vai dormir, porque aqui são 10h da noite, Helena!”

Mas a Helena já sabia muito bem que pra ser noite o céu tem que estar escuro.

“Vovó Sheila, você errou. Agora não são 10h da noite. Eu estou vendo, ainda é de dia, vovó. Você não vai dormir agora!”

Puxa, a singeleza das crianças!

É claro que a Sheila explicou que no lugar onde ela estava o dia corria diferente, não escurecia naquele horário. E foi então que a Helena pediu um presente daquele lugar exótico.

A Sheila já vinha pensando nisso. Por toda a cidade que passava, procurava um presente para a Helena e outro para decorar a casa nova da Marina. Não achava nada que fosse interessante o suficiente, que coubesse na mochila e não pesasse.

Passados uns dias, chegaram a Lucca, uma das cidades medievais mais turísticas da Itália. Lá a Sheila encontrou o presente da Helena e o guardou bem guardadinho para entregar a ela na volta para casa.

O mais bonito mesmo foi como uma exposição de quadros, com que cruzou inesperadamente, inspirou a Sheila a escrever uma cartinha para a neta, que postou via Face.

Dizia assim:

Quadro integrante da exposição na torre de Lucca, em julho de 2017, que mostra o nariz comprido do Pinocchio

“Minha linda Helena,

Hoje a vovó visitou a cidade do Pinocchio de verdade!

Ele nasceu e viveu num pequeno povoado que pertence à região de Lucca, chamado Collodi. Aqui em Lucca, onde a vovó está, tem Pinocchio pra todo lado, em diversos tamanhos e formatos… muito lindinhos!

 Ahh… e tem muitas torres altas, parecidas com a torre da Rapunzel, acredita?

Então, resolvi subir em uma e descobri uma exposição com quadros do Pinocchio (muitos pintados por um artista local, com várias cenas da história do menino de madeira).

Fotografei alguns quadros só para você!!!

Tenho certeza que você verá essas e outras maravilhas do mundo com os seus lindos olhos amendoados um dia… muitos beijinhos.”

Diz a Marina que Heleninha adorou!

O curioso é isso: ser criança para fazer as coisas de adulto, e depois de adulto ver a vida com olhos de criança. Naqueles dias, tantas vezes, ao nadarmos no riacho, arrumarmos nossas lancheiras, brincarmos de mapa, vestirmos nossos uniformes ou jantarmos varadas de fome após chegarmos sujas em casa, alcançamos o estado de graça de voltarmos no tempo.

 

 

Esta é a oitava crônica da série Pé Dá Letra, publicada aqui no Palavreira toda quarta-feira, com histórias inspiradas na peregrinação de sete brasileiras pela Via Francígena, em 2017. Para ver as fotos do trecho de  Pontremoli a Lucca, que inspirou esta história, visite o Peregrinas Mundo Afora no Facebook.

Para ler a crônica anterior, A Vareta do Diabo, clique aqui.

5 comentários

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    • Kele Morais em 29 de julho de 2018 às 11:23

    O encanto infantil dá passagem para a magia das palavras. Traz na lembrança cada momento vivido, traz alegria pra alma! Parabéns pela história encantável!

    • Adriana Dias em 25 de julho de 2018 às 23:51

    Orgulhosa de conhecer vocês

    1. Adriana, tenho saudades de você!

    • Mariângela Intrabartollo em 25 de julho de 2018 às 19:19

    Quanta delicadeza e sensibilidade nas entrelinhas! Uma crônica ritmada e inspiradora…parabéns!

    1. Mari, obrigada! Especialmente vindo de alguém tão delicada quanto você, é um elogio e tanto!

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