‘Indomável Sonhadora’: miséria e poesia

 

Indomável Sonhadora” (Beasts of the Southern Wild) não é um filme fácil de assistir.

Esqueça aquela cenografia plástica e perfeita do cinema. O diretor Benh Zeitlin mostra sem filtros, de uma forma naturalista, a pobreza em que vivem moradores de barracos às margens do rio Mississipi, numa localidade que os personagens chamam Bathtub.

Ali, próximos a uma barragem, a pequenina Hushpuppy, de cerca de 5 anos, costuma navegar com seu pai a bordo da carcaça de uma velha camionete transformada em barco, refletindo sobre o “povo do outro lado”.

É um cenário de miséria o que Hushpuppy habita com a maior naturalidade e resignação, como se não houvesse outro possível – ou sequer desejável.

Seu mundo só sofre um abalo quando ela estranha a ausência do pai por um dia inteiro. Quando ele reaparece, envolto em um camisolão de hospital e com uma pulseira de identificação no braço, começa a desconfiar que algo em seu mundo está sob ameaça.

Não demora para que monstros (as bestas do título original) de uma história, contada pela professora que dá aulas à beira do rio, passem a povoar suas divagações, como uma metáfora do seu medo do que está por vir.

E vem muita coisa… tempestade, inundação, destruição e a união dos vizinhos sobreviventes em um “acampamento” improvisado numa palafita.

Toda a realidade é processada pelo olhar ingênuo de Hushpuppy e traduzida por sua narrativa em off, de uma sabedoria pura e ingênua…

A cena do enfrentamento de seu maior medo é pura poesia visual. Tiro o chapéu para Ben Zeitlin por conseguir conjugar imagens de miséria, narrativa poética e metáforas visuais.