Fim da trigésima quinta semana do ano. Fim de agosto. Fim do ano quase na esquina. Fim de tantas vidas conhecidas nesta semana. As notícias vão pulando nas telas do celular e do computador e as palavras não são encontradas. Ensaio, ensaio, ensaio, queria tanto dizer mais do que um “sinto muito”… não que eu não sinta, pelo contrário, é justamente mais do que isso, tenho é sentido no nível do indizível, do inominável, e ensaio, ensaio, ensaio e tudo o que consigo dizer ou escrever, no fim de tanto ensaio, é “sinto muito”.
Um minuto de silêncio. Desde que conheci a morte de perto, sempre achei tão pouco esse um minuto. Minha primeira grande paixão, aos 20 anos apertado dentro de um caixão rodeado de flores brancas, o cheiro até hoje nas minhas narinas, e eu não entendia como o mundo continuava fazendo barulho lá fora. A vontade de sair correndo daquele velório e gritar na rua “parem tudo, parem tudo, meu amor morreu”, mas os carros passavam e o padeiro vendia pão e o gari varria a rua e as mães se apertavam nos portões das escolas às cinco da tarde. Como no poema do Ferreira Gullar sobre a morte de Clarice Lispector.
As pessoas sendo enterradas, agora sem o ritual da despedida, pelo menos o ritual que conhecemos até agora e que, entendi, mais do que nunca agora, é tão importante. Consigo me lembrar dos abraços que recebi no dia em que enterrei esse namorado, mesmo passados já quase 30 anos. O que uma amiga falou no meu ouvido na hora do abraço. O abraço de uma professora que não conseguiu falar. As bocas abertas e nenhuma palavra a sair. Quantas pessoas passando, só hoje, pelo que passei naquele dia, sem os abraços?
E a quadra do clube aqui ao lado de casa está sendo reformada e tenho pegado no pé dos meus filhos para que entreguem as lições de casa no prazo e tenho me preocupado com o horário das refeições e feito planos tentando não sucumbir à vontade de deitar no sofá e chorar com os joelhos no peito, esforço que em algum momento vai romper e não sei o que levará de mim, mas agora também não é hora de antecipações, dar conta do presente já tem exigido muito do passado e do futuro. E sei que virou clichê, mas é verdade que eu queria estar escrevendo com mais esperança e menos cansaço, animada com a reforma da quadra e com o pão caseiro que ficou bom e com a quintadinha que descobri perto de casa cheia de orgânicos… mas são muitas as mortes e eu preciso escutar o silêncio.