Avisos de múltiplas mensagens de Boas Festas ao celular e na cabeça o verso insistente do samba de Nelson Cavaquinho:
“tire seu sorriso do caminho
que eu quero passar com a minha dor”.
Habilito o silêncio no dispositivo, mas a decoração ascética na recepção da UTI deixa os olhos voltarem sempre aos alertas visuais de fotos e vídeos de Natal, mensagens efusivas de Ano Novo, manifestações de alegria, felicidade…
Tem sido assim pelos últimos 14 dias de nossa vigília por minha sogra, em luta contra três infecções neste hospital. O clima natalino reina fora, mas dentro de nós os corações solavancam a cada informe dos médicos… cada minuto parecendo muitos entre uma notícia e outra de pequenas melhoras e grandes pioras.
As emoções em gangorra nos deixam sem saber qual alívio esperar… Vida aprisionada ou descanso? Qual notícia desejar? Qual sofrimento escolher?
Os votos de Boas Festas continuam nos celulares e as mesmas histórias edificantes de Natal brotam, com novos sujeitos, de TVs e internet. Nas ruas, o burburinho frenético de carros e pessoas denunciam providências para as celebrações que se aproximam.
No começo, revoltava tanta alegria aviltando nossa tristeza. Agora o cansaço pavimenta a aceitação da alegria no outro como confirmação de nossa solidão.
É como se uma divisória transparente e maciça nos separasse de tudo e todos, mesmo havendo amigos a enviar recados carinhosos e parentes a testemunharem solidariedade.
As celebrações continuam e já começamos a sentir vergonha de estarmos tristes. Márcio faz voz boa para o primo preocupado ao telefone. Desliga e funga sob o espasmo de um soluço afogado.
Escondo-me no silêncio.
Quero que passe… que tudo passe… o Natal, as festas, tudo…
“Tire seu sorriso do caminho
que eu quero passar com a minha dor”