Nunca fui muito grande fã da obra do diretor e roteirista Blake Edwards, falecido neste 15 de dezembro, aos 88 anos, apesar de ter dado boas risadas com “Um convidado bem trapalhão” (The Party, EUA, 1968). Mas sempre serei grata por ele ter adaptado para o cinema a novela de Truman Capote “Bonequinha de Luxo” (Breakfast at Tiffany’s, EUA, 1961), um dos clássicos cinematográficos que mais marcaram minha memória emocional. Assisti ao filme várias e várias vezes na Sessão da Tarde da Globo, naquela fase de ouro, entre final dos anos 1970 e metade dos 1980, em que o horário exibia grandes clássicos da antiga Hollywood.
Lembro-me de, na infância ingênua a que minha geração teve direito, não ter entendido todas as referências do roteiro à profissão de Holly Golightly e nem à condição de gigolô do escritor com bloqueio criativo Paul Varjak (George Peppard) – jamais me ocorreu perguntar, por exemplo, por que diabos os acompanhantes de Holly sempre davam 50 dólares para ela ir ao banheiro ou por que a decoradora de Paul deixava dinheiro na cabeceira de sua cama (criança, devia colocar tudo na conta dos “estranhos costumes americanos”… rs).
Para mim, importava o glamour de ver Audrey, linda e longilínea em um longo de festa, comendo croissant com café na calçada da Tiffany’s; divertir-me com os diálogos interessantíssimos entre ela e Paul e liquefazer-me com o romantismo do dia que ambos passam juntos fazendo traquinagens por Manhattan… ao final do passeio, ambos magicamente surpresos no hall do prédio… ela subindo a máscara de gata para revelar os olhos brilhantes à espera de um beijo (ai, ai…).
Na televisão não podíamos voltar a cena, mas, ao comprar o DVD, realizei-me voltando tantas vezes quanto pude aguentar rever Holly surpreendendo Paul ao chegar em um beco, debaixo de chuva, para ajudá-lo a procurar por “Gato” – símbolo do desapego a laços que Holly cultivava com tanto desespero e que ela havia acabado de enxotar. A chuva, o beijo de ambos à sombra dos predinhos de Manhattan, carros passando e, ao fundo, os acordes de “Moon River”. Pura mágica hollywoodiana!
Tenho o hábito de procurar para ler os livros que inspiraram filmes que adorei assistir, mas me acovardei neste caso. Conhecendo a fama cáustica de seu autor, tive medo que a história original comprometesse para sempre esta minha memória emocional. No fundo, continuo uma “inglesa romântica”.