‘Flores do Oriente’ e um outro desabrochar

O efeito mais deprimente de toda guerra costuma ser a perda da humanidade – homens bestializados, usando o conflito como pretexto para exercer seus impulsos mais primitivos. Em “Flores do Oriente”, retorno ao grande circuito do cineasta chinês Zhang Yimou (“Lanternas Vermehas”), o agente funerário John (Christian Bale, o último Batman) faz o caminho inverso. Em plena zona de guerra, reencontra a sua humanidade, até então adormecida sob o instinto de sobrevivência.

Ele inicia o filme como uma personagem medíocre: um coveiro individualista, oportunista e alcoólatra que atravessa uma zona de guerra com o único interesse de receber a paga pelo sepultamento de um padre. Uma combinação de acasos o torna a única pessoa em condições de proteger um grupo de meninas e outro de mulheres (ironicamente estudantes católicas e prostitutas) que se refugiam numa igreja de Nanquim. Tentam se proteger do histórico massacre, que, estima-se, deixou 200 mil chineses mortos e cerca de 20 mil mulheres violentadas pelas tropas japonesas.

Se o acaso ajudou, foi o repertório interno de John – responsável por despertar-lhe repulsa em vez de conivência os atos de violência praticados pelos soldados – o fator determinante para sua transformação. É gradual o processo pelo qual ele emerge, escolha após escolha, de um repulsivo homem comum a um verdadeiro herói, disposto a correr riscos até então impensáveis em sua cartilha individualista. Sua transformação reflete-se no olhar da atraente Shujuan (Xinyi Zhang), por quem é repelido no começo, graças a sua abordagem grosseira.

Talvez tenha mais a ver com esta transformação do que com as beldades femininas em cena a escolha do título original do filme, “Flowers of War” (em português, flores da guerra). Porque é belo ver o desabrochar da humanidade de John em contraste com a selvageria da Guerra ao seu redor, exatamente como uma flor em meio a uma paisagem hostil.

Bem vindo de volta Yiimou.