Sempre gostei de setembro. Não só por ser o mês de meu aniversário, mas porque costumava ser o da despedida do frio e de chegada de um calor agradável, apaziguado por chuvas temporãs de verão – já disse em mais de uma crônica como adoro frio, chuva e seus cheiros todos… Ah, o de terra molhada e o das plantas agradecendo o alimento!
Mas os setembros não são mais os mesmos. Ficam cada vez mais secos e sufocantes desde que os fenômenos climáticos El Niño e La Niña começaram a mudar o comportamento das estações. E nesta Ribeirão Preto encravada numa depressão (assim me disseram sobre seu relevo) sequer os dias de inverno trazem frios adequados e nem meu mês preferido chega mais com águas esporádicas a prenunciarem o verão quente e úmido dos trópicos.
Azar meu! Talvez porque os genes lituanos de meu avô materno prevaleçam sobre os africanos de meu bisavô paterno, o frio e as águas me vitalizam corpo e mente, mas o calor me adoenta. As altas temperaturas me põem cansada, mau humorada e em um “estado de constante deselegância” – parafraseando minha vitoriana preferida, Jane Austen.
Os suores (estes sim, culpa de meus genes afro) me deixam testa, colo e axilas respingados em qualquer ambiente sem ar condicionado. E receber a primeira golfada de ar quente logo ao sair de um carro me faz cambalear de vertigem – a cabeça ferve, a vista escurece e a noção espacial desaparece por uns cinco segundos e meio.
E não adiantam duchas frias – que de frias têm pouco quando a água da caixa de seu prédio desce fervendo pelo chuveiro – nem ventiladores, que, a depender de como o sol bate no cômodo, só fazem movimentar ar quente, sem refrescar nada. Só quilowatts gastos em ar-condicionado na causa!
E quem disse que toalha molhada na janela ajuda a minorar a secura ambiente não conhece as taxas de umidade de deserto da minha cidade. O jeito é apelar pra muita hidratação oral… e olhe lá!
Enfim, este texto é só pra dizer que, se vontade firme ajudar, tô dentro de qualquer esforço quântico, macumba ou dança da chuva que ajudarem a convencer o universo a apaziguar as fúrias de Niños e Niñas neste hemisfério sul.
Quero meus perdidos setembros de volta!
3 comentários
Silvia, acho que estamos espelhadas ou você é uma bruxa que tudo vê… chorei de rir porque parece que sou eu vivendo no seu texto.
Ixe! Agora você mexeu com um dos meus princípios mais sagrados: o direito de curtir uma verdadeira e lenta mudança de estação e um inverno inteirinho, de 90 dias no mínimo, sem interferência de quaisquer fenômenos climáticos previsíveis ou imprevisíveis. Seu texto me inspira a escrever um outro: Por que eu odeio fevereiro, mesmo sendo o mês do meu aniversário.
Tenho uma lembrança – melhor dizendo, uma sensação corpórea – de morte iminente por desidratação. Me vejo dormindo num berço colocado perto de uma janela num dia de muito sol e calor. No tempo em que eu nasci era comum as mães enrolarem seus bebês em um cueiro, prendendo os bracinhos e mãos, além de os vestirem com roupas de lã da cabeça aos pés. Imagine a tortura que era não poder se mexer ou ainda não saber falar para implorar que sua mãe a ajudasse a se livrar do calor sufocante. Essa lembrança volta à minha mente sempre que o termômetro passa dos 25 graus. Transpirar me dá nojo e me faz entrar em guerra com meu próprio corpo.
Escrevi até um texto, há muitos anos, ao qual dei o título de “Ode ao frio” em que eu afirmo que “só o frio consegue nos encaixar com precisão na moldura da condição humana” – porque ele convida ao contato com o corpo do outro, ao acolhimento e à aproximação fraterna até com os desconhecidos.
Silvinha, nunca me senti tão mal com o calor como agora. Estou inquieta, chata, sufocada. Hoje fez cotação de ventilador, não dá.
Tô dentro no caso de macumba.