Jornalista com 30 anos de experiência em redações, blogueira de cinema, séries e literatura e desde 2019 trabalhando free lance com produção e edição de conteúdos; Silvia Pereira adora ouvir, ler, assistir e - principalmente - escrever histórias.
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dez 27 2019
‘Dois Papas’: Meirelles ensina a construir pontes
Filmes baseados em fatos reais costumam despertar questionamentos sobre quanto de verdade foi preservada na criação de seus roteiros e quanto de ficção foi usada para tornar suas narrativas mais palatáveis ao espectador. No caso de “Dois Papas”, dirigido pelo brasileiro Fernando Meirelles (“Cidade de Deus”), essas questões certamente surgirão, mas meu conselho é que você as esqueça completamente para se concentrar no melhor motivo para saborear este belíssimo libelo sobre diálogo, redenção e fé.
Até porque fica muito clara a intenção de Meirelles com esta adaptação cinematográfica para o livro de Anthony McCarten – que também assina o roteiro: mostrar, nestes tempos de intolerância e radicalismos políticos, como o diálogo entre correntes de pensamento opostas é possível quando conduzido com respeito, empatia e, principalmente, disposição para ouvir. O registro biográfico fica em segundo plano.
No caso de “Dois Papas” temos, de um lado, o religioso alemão Joseph Ratzigner, cujo pontificado como Bento XVI foi marcado por uma defesa ferrenha dos dogmas seculares da Igreja Católica (proclamações solenes que devem ser consideradas definitivas, infalíveis, imutáveis e inquestionáveis pelos fiéis). De outro, está o então cardeal argentino Jorge Bergoglio – que viria a se tornar o papa Francisco -, de formação jesuíta (ordem conhecida pelo trabalho missionário e educacional, que presta voto de pobreza) e com ideias próprias e pouco ortodoxas sobre tais dogmas.
Os protagonistas são interpretados, respectivamente, pelo veteranos Anthony Hopkins e Jonathan Price, atores ingleses que nos premiam com atuações “exatas” e irretocáveis. Cabe a eles – principalmente ao carismático Price – parte do mérito pelo filme não ter resultado massante, mesmo sendo quase todo alicerçado em diálogos e limitado a poucos cenários. Mas a maior parte cabe mesmo a Meirelles, que demonstra, mais uma vez, sua maestria na direção de atores e muita sensibilidade na orquestração das cenas. A montagem também é muitíssimo bem amarrada.
Esgrima dialética
A química entre os protagonistas começa quando Bergoglio é convocado a Roma por Bento XVI, em um dia qualquer de 2012. O argentino vai encontrá-lo em Castel Gandolfo – residência de verão do papa – com a intenção de pedir a assinatura dele em seu pedido de aposentadoria. Entre negativas veladas de um e divertidas investidas do outro, o que se segue, ao longo de três encontros, são diálogos que tecem uma espécie de esgrima dialética entre os padres. Começa com discordâncias sobre temas comezinhos do sacerdócio, como o celibato dos padres, homossexualidade e a consagração da comunhão a divorciados. Evolui para discussões filosóficas, como a natureza (i)mutável de Deus, que seguem temperadas por sutis pitadas de humor. O que é melhor: sem nenhum hermetismo. A linguagem é simples, mas nem por isso raso o conteúdo.
Não por acaso, o roteiro faz ao menos três menções a “muros” e “pontes” como metáforas das defesas que a Igreja sempre ergueu em torno de si para proteger-se de mudanças (os muros), em oposição aos caminhos abertos para o diálogo (as pontes) que Bergoglio propõe para reconectá-la a seus fiéis. “Construímos muros ao nosso redor o tempo todo enquanto o real perigo estava dentro, conosco”, dispara o argentino, antes de introduzir uma crítica clara à postura da Igreja ante as denúncias de abusos de crianças por padres.
Mas é quando a conversa deságua em confissões pessoais que a narrativa realmente atinge seu clímax! Numa Capela Sistina deserta, ambos os sacerdotes se despem de seus papeis para apresentarem-se um ao outro como humanos falíveis, tão pecadores quanto quaisquer outros. É tocante a forma como os até então antagonistas acabam se acolhendo, se amparando e lembrando um ao outro o mecanismo do perdão.
É como atravessam, juntos e finalmente irmanados, a ponte que construíram ao longo de 2 horas (tudo somado) de diálogo honesto e respeitoso. Um exemplo que, certamente, todos nós poderíamos aproveitar muito bem.
out 20 2019
‘Coringa’ e nossa embaraçosa catarse
Que atire a primeira pipoca o espectador de “Coringa” (Joker, 2019) que não empatizou com seu protagonista a ponto de, lá no fundinho, achar “bem feito” os crimes que ele acaba por cometer.
Esta é a grande armadilha do filme dirigido e co-roteirizado por Todd Phillips (pausa pra me chocar com o fato deste produtor, diretor e roteirista ter se especializado, antes, mais em besteiróis do nível de ‘Se Beber, Não Case’). Ele e o co-roteirista Scott Silver (“O Vencedor”) nos levam de tal forma a nos compadecer do dócil e maltratado Arthur Fleck – palhaço de rua triste que não controla o riso compulsivo em situações de estresse – que, sem nos darmos conta, continuamos a torcer por ele quando passa a assumir sua natureza psicopata.
Fez eu me lembrar do filme “A Onda” (The Wave, EUA, 1981; e Die Welle, Alemanha, 2008), que retrata a história verídica de um experimento realizado por um professor de História com seus alunos, a fim de provar, na prática, como uma sociedade inteira é levada a apoiar um regime racista, capaz de genocídio em massa – caso do Nazismo na Segunda Guerra Mundial. Mal comparando, é mais ou menos como milhões de pessoas acabam elegendo um líder que prega o machismo, a misoginia e a violência: fazendo nos identificar com histórias que busquem, lá em nosso subconsciente, nossos maiores medos e fraquezas e nos convençam de que “tudo bem” aniquilarmos quem este líder nos aponta como responsáveis por fazerem vibrar essas cordas. Dá uma sensação acolhedora de pertencimento nos ver representados por alguém que prometa se vingar por nós, né?
Está aí a armadilha!
E catarse é o nome dado pela psicanálise a este sentimento de “evacuação” de emoções internas (represadas em prol da civilidade) por meio de uma experiência fora de nós. É o que nos faz vibrar quando assistimos ao palhaço alquebrado finalmente defender-se de uma agressão gratuita, ainda que desproporcionalmente.
Se você não cedeu a esta embaraçosa catarse, parabéns! Pode se considerar um primor de civilidade, além de uma “pedra de gelo”, à prova de obras de arte que cumpram, para além do entretenimento, seu papel original: nos colocar um espelho nas fuças, para que nos reconheçamos nele e possamos extravasar nossos instintos primitivos apenas no terreno da ficção.
Por alcançar este intento de forma magistral é que “Coringa” entra para o rol das grandes obras-primas do cinema contemporâneo, ao lado de outras produções do gênero que bebem na fonte das histórias em quadrinhos – todos os “Batman” de Christopher Nolan entre eles.
Aliás, não por acaso está na trilogia de Nolan a outra interpretação impecável do mesmo personagem, que elevou a atuação do saudoso Heath Ledger ao altar das mais memoráveis do cinema. Porém, não há comparação possível entre seu Coringa e o de Joaquin Phoenix. São duas grandezas distintas, nenhuma maior ou menor que a outra, até porque o mesmo personagem ganha tintas diferentes em uma e outra produção.
O Coringa de Ledger carrega o mesmo signo do caos do de Phoenix, herdado de seu original da HQ, mas nos arrebata mais por suas geniais falas, magistralmente interpretadas pelo ator. Não chegamos a torcer pelo personagem, por mais que nos dê prazer cada uma de suas aparições magnetizantes na tela. Já o de Phoenix nos mantém o tempo todo suspensos pelo anzol da empatia. Por exemplo [alerta de spoiler!], desminta se você também não ficou sem saber se sentia repulsa ou compaixão por ele na cena em que, com o rosto branco ainda respingado de sangue, despede-se do amigo anão com um beijo na testa e palavras de gratidão pela amizade, ditas em um inconfundível tom de ternura (que interpretação, senhoras e senhores!).
Demorei alguns quartos de hora pra me tocar do absurdo de simpatizar com um assassino e enxergar o que diz sobre nós a cena em que ele dança em cima de uma viatura, aplaudido pela multidão: que todos temos dentro as mesmas sombras que a condição psiquiátrica de Coringa faz aflorarem à superfície de seu consciente; e que, devidamente incentivados, também somos capazes de aplaudir a barbárie. Ou não seriam tantos os que, entre nós, aprovam jargões como “bandido bom é bandido morto”.
Lamentável é que alguns de nós levem esta necessidade de catarse para a vida, aplaudindo e incentivando o ódio contra o diferente, que sempre vai nos ameaçar (culpa de nossos vieses inconscientes construídos desde a pré-História).
Seria bom se todos abríssemos os olhos para enxergar que as periferias pobres do mundo estão cheias de “coringas em potencial”, a sofrerem humilhações, violências e injustiças sociais, às vezes cometidas por quem deveria lhes proteger – governo e polícia, por exemplo. Mas nossa percepção vai só até o ódio primitivo que nos aflora quando somos assaltados por eles. Porque para nós, ditos “civilizados”, sentir empatia por excluídos que ameaçam a segurança e a ordem sociais… só no cinema mesmo, né?
P.S. PALMAS PARA O ROCKÃO DO CREAM (“White Room”,1968 ) EMBALANDO UMA DAS CENAS DE DANÇA DO CORINGA?!?!
ago 25 2019
‘Dor e Glória’: o ocaso de um cineasta
Já faz alguns filmes que não encontro palavras para descrever os sentimentos que a narrativa de Pedro Almodóvar me despertam – digamos que as cordas tocadas por suas últimas obras dramáticas em meu instrumento de sentir são, algumas vezes, novidades até para mim. Mas vou tentar escrever sobre a mais recente produção a receber a sua assinatura no roteiro e direção: “Dor e Glória” (Dolor Y Gloria, Espanha, 2019).
O encantamento começa já nos letreiros iniciais, emoldurados por verdadeiras obras de arte, pródigas em cores vivas – uma característica do cinema do espanhol presente também nos cenários e figurinos, embora de forma bem menos explosiva neste trabalho do que em seus primeiros.
Nesta produção, o diretor espanhol se reencontra com o ídolo de seus primeiros sucessos de público e crítica: o ator Antonio Banderas, que incorpora uma espécie de seu alter ego. Na pele do cineasta Salvador Mallo, um Banderas envelhecido revisita memórias de infância, antigos afetos e reconcilia-se com ao menos um desafeto. Tudo isso enquanto convive – às custas de coquetéis medicamentosos e, eventualmente, drogas – com dores físicas que o incapacitam para o trabalho e deprimem seu humor.
Mas não se enganem. Não se trata de um drama pesado. Nostálgico, sim. Sensível, idem! Mas nem um pouco depressivo.
E pode parecer difícil de acreditar – principalmente para quem costuma reduzir a obra de Almodóvar àquele cinema feérico que o lançou para o sucesso mundial, na década de 1980 -, mas desde “A Flor do Meu Segredo” (1995) ele vem preferindo a sutileza ao exagero quando se trata de evocar lugares e histórias caros à sua memória afetiva.
É o caso numa das primeiras cenas de “Dor e Glória”, que nos brinda com o canto à capela do bolero flamenco “A Tu Vera”, entoado por quatro lavadeiras, à margem de um riacho onde lavam roupas. Poesia para os sentidos!
O cenário é a região de Paterna, na província espanhola de Valência, onde Salvador passou a infância. Uma das lavadeiras é sua mãe, interpretada na versão mais jovem pela atriz Penelope Cruz – que, aliás, já soltou a voz em outras películas do diretor (“Volver”, de 2006, por exemplo).
Uma curiosidade: mais novo fenômeno da música mundial gestado pela Espanha, a cantora Rosalía faz sua primeira ponta no cinema como outra das lavadeiras (a de vermelho na foto acima).
Esta e outras cenas, como a do monólogo teatral que o ex-desafeto encena a partir de um texto confessional do diretor, é que tocam as tais cordinhas emocionais a que me refiro no início deste texto. É como se existissem camadas de narrativa não-verbais escondidas por baixo da construção de cada cena ou diálogo. Assim é que o telão em branco no cenário do monólogo não é só um artifício cênico. A depender do espectador, pode soar como uma metáfora da vida a acontecer, da juventude, ou do vazio que Salvador tenta expurgar através do texto autobiográfico.
Subtextos prescindem de palavras, por isso só o coração (ou seja lá como chamemos o tal instrumento de sentir dentro de nosso cérebro) consegue alcançar.
ago 18 2019
Esperança
Hoje, ante o caos social, moral e político instalado no Brasil, tento encontrar algum consolo na esperança de que, no futuro, a história passará a limpo este período; de que escritores e cineastas o retratarão como realmente está acontecendo, como outros livros e filmes já retrataram, antes, os horrores do nazismo e das ditaduras mais sangrentas.
Quando – E SE – isso acontecer, espero que quem aplaude o atual estado de coisas tenha coragem de dizer a seus netos e bisnetos de que lado estavam. Não porque acredite que as novas gerações aprendam com os erros das anteriores – fosse assim, não estaríamos assistindo tanta gente aplaudir o ódio, a xenofobia e a destruição ambiental após inúmeras obras históricas documentarem seus malefícios -, mas porque acredito em redenção. E a desejo para todos que hoje compactuam com o que causa sofrimento a outros.
Espero que os redimidos tenham coragem de explicar a seus entes queridos que padecerem de câncer porque foi errado apoiarem dirigentes que liberavam agrotóxicos em favor de ganhos econômicos para uma minoria; que os desastres ambientais que arrasarem as conquistas de uma vida inteira deve-se à indiferença de sua geração com a questão ambiental; e que contribuíram para o aumento da violência apoiando medidas que intensificam a desigualdade social, fabricante de excluídos – muitos dos quais escolhem tornar-se criminosos por não se importarem em fazer mal a uma sociedade que os ignora e tanto faz morrerem de tiro, fome ou doença que o Poder Público não trata direito, ou irem para uma prisão que não é muito diferente da vida que têm em suas comunidades pobres.
Como meu sábio marido diz, “a evolução é pessoal”. Precisa ser, pois se fosse resultado de processo coletivo, não seria fruto de reflexão e vontade próprias e, assim, não seria consciente – consequentemente nem legítima ou duradoura.
Lanço então minha esperança ao universo, junto com o meu desejo de que algum ensinamento nasça desse caos em que vivemos hoje.
Boa esperança para todos, hoje e sempre (e que ninguém solte a mão de ninguém)!
Amém.
ago 15 2019
No espelho, com minha idade
Antes de assumir meus cabelos grisalhos em definitivo, tentei por duas vezes deixá-los crescer sem tintura. Desistia sempre que o espelho me mostrava o inevitável: os fios brancos me envelhecem, sim!… por mais que o corte seja sofisticado, que eu use os xampus certos, que cuide para nunca amarelarem ou ficarem opacos e cinzas.
Só consegui após um acontecimento que mudou minha forma de me enxergar e ao mundo: um acidente de moto que me tirou de circulação por um ano inteiro – quebrei as duas pernas. Claro que não era uma prioridade sair para pintar o cabelo ou chamar alguém para fazê-lo em casa, quando apenas ser transferida da cama para a cadeira de rodas ou passar muito tempo sentada era torturante.
Durante o período de recuperação física, encontrei a coragem para me aceitar em frente ao espelho com a idade que tenho. É verdade que também ajudou a sensação de liberdade por não ter mais que me preocupar com retoques de raízes, reservar aquela grana para pagar a tintura no salão preferido (confiar no cabeleireiro é tu-do!) e uma hidratação caprichada nos fios ressentidos pelos maus-tratos da química.
Mas não me entendam mal: não sou, absolutamente, contra a tintura. Até porque eu mesma brinquei com as cores em minhas madeixas por 30 anos – comecei antes de aparecer o primeiro fio branco em minha cabeleira escura de neta de afro-brasileiro com índia (tenho um avô lituano também, mas suas características caucasianas ficaram todas para as minhas irmãs). Já as tive preto-azuladas, castanhas acobreadas, bicolores (vermelho na metade de baixo e preto na de cima), com mechas prateadas só em torno do rosto, luzes vermelhas no cabelo todo, californianas caramelo nas pontas… Enfim, nunca fui muito ortodoxa sobre isso e sempre encontrei cabeleireiros loucos o bastante para executarem minhas ideias.
Por incrível que possa parecer, porém, cultivei secretamente a vontade de assumir meus brancos por muito tempo, inspirada em minha mãe. Sempre achei lindos seus grisalhos ondulados, que quando longos caíam em cachos volumosos sobre seus ombros.
Mas se foi preciso coragem para enfrentar o espelho, vocês não imaginam o que foi encarar a “patrulha social”, exercida, inclusive, por pessoas queridas – às quais, aliás, dou a maior abertura para opinar e criticar qualquer coisa em mim, desde que eu não tenha que concordar sempre com elas.
Entre os questionamentos que ouvi de uma delas estava este, apresentado com voz e postura de indignação: “você, entre todas nós (da turma de faculdade) é a que ainda não tem rugas e pode passar por mais jovem de cabelos tingidos. Por que está optando por parecer mais velha? Se fosse ideologia, eu até entendia, mas por preguiça de pintar!”.
Foi quando me despertou a reflexão que proponho aqui, atiçada pelas seguintes questões: qual o problema de ostentar a idade que se tem? Juventude é um requisito indispensável à boa aparência? Por que principalmente nós, mulheres, temos vergonha de informar a idade? Mais: por que é deselegante perguntar a idade de uma mulher?
Ok. Tem a história do preconceito contra os mais velhos, que são tratados desde com indiferença até com desrespeito em muitos lugares, mas, primeiro: os errados são quem os destrata; segundo: fosse este o motivo, por que nos homens o grisalho é considerado charmosíssimo?
Não sou adepta do bordão “nunca me arrependo de nada” – fosse assim não teria aprendido com metade dos erros que cometi na vida -, mas não tenho vergonha de minha trajetória. Por que deveria ter do tempo que ela me custou?
Importante esclarecer também que não estou desistindo de minha vaidade. Quero, sim, sempre me sentir bonita e, na medida do possível, tornar-me uma idosa tão linda quanto acho minha mãe até hoje. E tanto não tenho preguiça de salão que agora comecei a brincar com os meus brancos. Acabo de tonalizá-los na cor azul (sai em cinco lavadas, mas é divertido enquanto dura!).
Ainda não recebi muitas avaliações sobre isso, mas pelo menos uma pessoa está amando a brincadeira: EU!
Por ora, é suficiente.
abr 16 2019
Diários do SUS: dia 3
Em seu terceiro dia de espera por internação, na sala de Observação da Santa Casa de Ribeirão Preto, mamãe mantém a candura de sempre. A expressão é de cansaço, e o humor, deprimido, por mais que ela tente disfarçar. Mas ela nunca reclama de nada e se interessa genuinamente por todos os outros pacientes à sua volta.
Quando cheguei para mais uma jornada de 12 horas como sua acompanhante, havia mais uma maca com paciente na mesma baia que a dela – aliás, como em todas as outras, que deveriam abrigar apenas uma cama.
Aprendi nesses dias que vagas estão entre as inúmeras carências do serviço público de saúde ribeirão-pretano. Falta de tudo. De itens básicos, como roupas de cama e banho para todos, até os mais macro – aparelhamento tecnológico, insumos, mão-de-obra com e sem qualificação, etc. Eles existem, mas não o suficiente
Em meus 28 anos como jornalista, fiz e editei muitas reportagens sobre as agruras por que passam os usuários do SUS, mas nada como senti-las na pele.
Não cabem nos espaços e tempos limitados dos jornais impressos e televisivos todos os detalhes denotativos do abandono que essas carências nos fazem sentir. Por exemplo, no primeiro dia de mamãe por aqui, levou horas para eu conseguir o primeiro lençol para cobri-la; mais 1h para ela herdar um cobertor de um leito liberado e dois dias para lhe sobrar um travesseiro.
Fraldas geriátricas, toalha, medicamentos usuais e sabonete só trazendo de casa, e melhor não esperar por um enfermeiro que ajude a trocar fralda, dar banho ou levar seu paciente ao banheiro. Pode levar horas ou nem acontecer.
Melhor também ficar atenta à chegada dos médicos para, se for caso, educadamente lembrá-lo de ver seu paciente, pois são tantos, em tão pouco espaço, que às vezes algum “passa batido “. O mesmo para o pessoal da Enfermagem, que precisa auscultar e fazer medições regulares dos pacientes. Às vezes, simplesmente não dá tempo de fazê-lo em todos dentro de um mesmo turno.
Mais importante de tudo é lembrar que nada é culpa de qualquer profissional dali. Todos fazem o que podem. De verdade. Por isso tento não gritar com alguém quando uma dessas tantas carências eleva minha revolta a níveis insuportáveis. Até porque a vida e o “conforto” de mamãe estão nas mãos desses profissionais.
Em última análise, somos todos – acompanhantes, pacientes, médicos e enfermeiros – humanos, portanto suscetíveis a reações emocionais como qualquer outro. Mas ninguém quer um profissional de saúde de má vontade ou extremamente estressado cuidando de sua própria mãe.
abr 14 2019
Minha mãe tem fome!
Minha mãe tem fome. Não só de comida.
São 9h da manhã de um domingo de abril. Eu a acompanho na sala de observação da Santa Casa de Ribeirão Preto desde as 8h, quando rendi minha irmã, que passou a madrugada toda com ela. Antes, das 18h às 23h de sábado, foi minha outra irmã quem a acompanhou na longa espera por atendimento na UPA, que de Pronto Atendimento – como reza sua sigla – não tem nada.
Mamãe chegou à unidade pouco antes das 19h do sábado sentindo sintomas que acreditamos ser de um novo AVC (já teve três, conhece bem). Na Triagem, foi colocada como atendimento prioritário e mesmo assim só foi chamada 3h30 depois.
Uma jovem e educada médica desconfia de um micro derrame e dá encaminhamento para o hospital, onde uma investigação mais apurada deve ser conduzida. O Serviço de Regulação (que administra as vagas em hospitais) informa que um leito de SUS só vagaria no dia seguinte e mamãe passa a noite numa maca da UPA, com minha irmã insone ao lado.
Quatorze horas depois, mamãe só se queixa de fome. Não pode comer antes de o neurologista do plantão avaliá-la… e ele não chega! Ela está medicada só para as dores – de cabeça e musculares, pelas quatro quedas sofridas – e sequer temos a confirmação de seu diagnóstico.
Em minha cabeça ecoa, como uma sirene, tudo o que já li sobre o custo da espera pelo devido socorro a um paciente de AVC. Desde ontem mamãe não sente o lado esquerdo inteiro de seu corpo. Já tinha a perna e braço direitos “bobos” – sequela de dois AVC anteriores, sofridos dois anos atrás, em um mesmo dia (o primeiro, há dez, foi isquêmico, sem danos permanentes). Ainda tem que lidar com o jejum prolongado – sua última alimentação foi um lanche de pão com frios que levei à UPA 13 horas antes.
Minha mãe tem fome de comida e de cuidados. Meu impulso é gritar, cobrar médico, fazer escândalo, mas a sala cheia de outros pacientes na mesma situação me contém – eu só os incomodaria, e estressaria as equipes de enfermagem, que não têm culpa da falta de estrutura com que trabalham.
Mamãe tem frio. Só um edredom fino que minha irmã trouxe de casa a cobre. Preciso pedir que um enfermeiro cace um lençol limpo. Mais um cobertor só quando vagar algum leito (1h depois surge um). Uma enfermeira me instrui a comprar fraldas geriátricas para ela, pois o hospital não fornece.
Obtenho permissão para mamãe ingerir uma banana que trago na bolsa. Às 10h30, a Copa serve uma sopinha a todos os pacientes, mas não para ela (sem médico, sem comida), que sofre calada sentindo o cheirinho de comida no ar.
Reflito que a fome é só mais uma privação com a qual ela tem tido que lidar em sua velhice, que pode ficar ainda mais abandonada com a Reforma da Previdência que vem por aí – discute-se diminuir (mais!) o valor do benefício mínimo dos aposentados mais pobres e suspender o adicional para beneficiários que comprovadamente demandam cuidados em tempo integral.
Mamãe e meu pai – que trata um câncer de próstata com metástases – já não conseguem pagar todos os remédios de que precisam com suas aposentadorias. Mesmo separados, têm que viver na mesma casa com minha irmã mais velha para economizar gastos, inclusive com cuidadores – um deve “olhar” o outro enquanto as filhas trabalham e, eventualmente, soar o alarme para uma de nós acudir em caso de ocorrência de saúde.
A cada dia ambos ficam mais debilitados e temo que o momento de necessitarem cuidados mais intensivos tenha chegado antes de termos um plano B. O medo do que virá faz a gastrite acordar em meu estômago e, na falta de calmante melhor, aciono minha principal válvula de escape: a escrita.
10h43 e nada de médico.
12h: minha mãe começa a chorar, me desintegrando toda por dentro. Não é só de fome… “É de abandono, filha”.
Não tem jeito… Vou ter que gritar com alguém…
A SAGA CONTINUA…
Após questionamentos indignados, seguidos de uma crise de choro, consigo que localizem o neuro do plantão para avaliar minha mãe. Um médico “menino”, de seus 20 e poucos anos, gasta seu sotaque mineiro justificando-se pra mim, que, soluçante, devo formar um quadro assustador. “Não se preocupe comigo, dr. Só avalie minha mãe, por favor!”.
Ele avalia. Diz que pedirá uma tomografia, por isso o jejum precisa continuar. Pede mais uns 40 minutos de paciência.
Só 1h30 depois o enfermeiro vem buscar minha mãe para o exame, mas desiste ao saber que, antes, ela precisa ter a fralda trocada. Promete voltar para fazê-lo e passa outra paciente à frente dela na fila do exame.
Às 16h30 eu desisto de esperar e decido eu mesma trocar a fralda de mamãe, que a esta altura deita sobre lençóis molhados. Um enfermeiro vem ajudar. Questiono a demora em levá-la pra fazer a tomografia e descubro que ela não foi ainda por falta de maca.
17h: a maca aparece. Eu a acompanho à tomografia. Agora dependemos de o médico ter tempo de avaliar o exame para autorizar que ela se alimente, o que só ocorre mais de 1h depois – perto de completar 24h de jejum quase completo.
18h: O resultado sai. É AVC mesmo, diz o médico, que recomenda uma ressonância para investigar o tamanho do dano. Ele explica que só será possível fazê-la com internação, e para internar tem que haver leito vago em algum quarto. Esperamos.
23h: ela pede pra ir ao banheiro. Eu a levo sozinha, colocando-a e tirando-a da cadeira de banho – desisto de esperar por um enfermeiro.
Percebo que vaza sangue de seu equipo (peça do equipamento que injeta soro pela veia) e peço que investiguem. “Está com defeito. Vieram vários com defeito”, diz uma enfermeira, que desliga o soro e promete mandar alguém substituir a peça. Ninguém aparece por TRÊS HORAS, apesar d’eu cobrar a cada 30 minutos.
Mamãe continua com frio, mas não tem mais um cobertor. O vazamento do equipo pintassilga sangue por seus lençol e camisola, que não podem ser trocados. “Não tem”, é a resposta padrão para tudo por aqui.
3h da madrugada de segunda-feira: finalmente um enfermeiro de meia idade – muito gentil por sinal – troca o equipo de mamãe, fazendo o soro voltar a correr por suas veias. Também encontra uma nova camisola e ajuda a ajustar a cama de uma forma que a deixe mais confortável e segura (Deus o abençoe!).
4h: mamãe dorme (graças a Deus e ao Zolpidem), mas continuamos sem quarto, sem internação, sem ressonância e sem previsão de nada até de manhã.
A saga vai continuar…
mar 26 2019
Contrição
Em meu nome e de todo o povo brasileiro, peço desculpas por nosso presidente ter autorizado a comemoração de um golpe militar que culminou na privação de liberdades coletivas e individuais, na tortura e morte de milhares de brasileiros pela máquina repressora da Ditadura. Apesar de não ter votado nele, respeito e prezo a democracia que permitiu sua eleição e rezo para que ela sobreviva ao retrocesso que tenta promover.
Humildemente peço desculpas a todas as pessoas que tiveram seu corpo e mente violados durante o regime repressor e sobreviveram para assistir à memória de seus sofrimentos ser aviltada. Estendo-as aos filhos, filhas, pais, mães, maridos e esposas dos que não sobreviveram – muitos dos quais sequer tiveram um enterro digno, porque seus corpos nunca foram encontrados.
Desculpas a todos os opositores do regime que amargaram exílios forçados, expatriados de seus afetos.
Peço perdão aos historiadores que estão tendo seus minuciosos e sérios trabalhos de pesquisa e documentação desonrados pela negação dos fatos que comprovam. E por serem estes trabalhos alvo de chacota e descrédito dos seguidores desse presidente peço renovadas desculpas.
Solidariedade e desculpas a todos os colegas jornalistas que foram calados pela censura do regime, muitos dos quais também acabaram presos ou mortos.
Peço perdão a todos os artistas que tiveram suas energias criadoras asfixiadas pelas proibições de músicas, novelas, peças de teatros, livros e todo o tipo de veículo cultural que, ao longo da história, ajudaram a humanidade a conhecer-se e, consequentemente, evoluir.
Encarecidas desculpas aos professores que teimaram em cumprir suas sagradas missões de informar e formar jovens mentes em ambientes hostis e amordaçados por censura ideológica durante os anos de chumbo. ELES NÃO TÊM CULPA por muitos de nós terem crescido ignorantes da realidade sombria que nos rodeava a ponto de hoje aplaudirem a celebração do golpe.
Envergonhadas desculpas à geração de crianças que corre o risco de também crescer acreditando que a Ditadura Militar foi boa para o País e deve voltar.
Desculpo-me também com os militares de hoje que não aprovam as práticas repressivas de seus antecessores. Imagino como devem se constranger por tal celebração fazer muitos de nós enxergarem em suas fardas uma ameaça e a eles como inimigos.
E se esta contrição me trouxer, futuramente, consequências iguais às que outros antes de mim sofreram por não se calarem, peço antecipadas desculpas aos amigos e familiares que se condoerem por mim.
Por fim, peço solidárias desculpas aos que odeiam, pois minha revolta já me colocou onde estão agora – é um péssimo lugar para estar! -, contribuindo para a energia funesta em que todos vibramos neste momento.
E que Deus tenha piedade de todos nós!
mar 05 2019
Crônica pra consolar gente grande
Balanço os músculos doridos de biribol abrigada numa rede à beira de uma piscina. Após meses (anos?) de perdas e lutos eu e Márcio nos soltamos, gratos, à rede invisível de novos afetos…
Leio ao celular notícias do mundo lá fora… a tristeza de notícias sobre governantes obtusos, o ódio vexatório destilado sobre a memória de um anjo chorado pelo avô encarcerado…
Mas a esperança também me alcança pelas letras de sambas-enredos cantados na maior folia do mundo.
Cantam Marielles, Dandaras, bodes expiatórios e todo o bom-senso.
“Vendeu-se o Brasil num palanque da praça
E ao homem serviu ferro, lodo e mordaça
Vendeu-se o Brasil do sertão até o mangue
E o homem servil verteu lágrimas de sangue”
Penso, afinal, que existe esperança no mundo porque, mais uma vez, os gritos de alerta sobre o absurdo das coisas vêm pela Cultura, que o novo governo quer tanto sufocar.
As histórias “pra ninar gente grande” evocam “a história que a história não conta” nos versos verde-e-rosa de Mangueira, cantados na passarela carioca do samba.
É a manifestação do povo que sustenta a maior festa do mundo… uma porção do povo que convive com exclusões de todos os níveis, imprensada entre fuzis de criminosos (com e sem farda) entregue a poderes paralelos, milícias sem lei…
Há esperança afinal.
E ela também se entranha em mim daqui de nosso oásis rural, com nomes de Márcia, Paula, Adriano, Silvana, Beto, Luís, Tati, Tânia, João Paulo, Mateuses… ecoando amores de mães, pais, irmãos, santos, deuses, Jesus e tudo o mais que rima com afeto.
Penso que enquanto houver voz, amor e amigos sempre haverá esperança.
fev 17 2019
‘Bohemian Rhapsody’: filme de fã
por Silvia Pereira
Um dos títulos concorrentes ao Oscar 2019 de Melhor Filme, “Bohemian Rhapsody” é, antes de tudo, um filme de fã. Uma cinebiografia “baba-ovo” total do grupo de rock inglês Queen. E digo isso “pagando pau”, porque… SIM!… estou entre os mais fervorosos fãs da banda que revolucionou o mercado fonográfico com a gravação, em 1975, do hit homônimo ao filme.
Ainda hoje me arrepia ouvir o vocal a capela que introduz “Bohemian Rhapsody” (“Is this the real life / Is this just fantasy…”). Igualzinho ao que senti na primeira vez que a vitrolinha verde de casa reproduziu os discos da banda, que minha irmã trouxe emprestados de um vizinho. Eu devia ter uns 9 anos de idade e, desde então, as músicas do Queen, com seus arranjos malucos e vocais grandiosos, vêm ocupando uma posição majoritária na trilha sonora da minha vida, fabricando e evocando memórias afetivas.
“Bohemian Rhapsody”, a música, tem 6 minutos (impensáveis para a época) de duração, solos de guitarra do rock, vocais operísticos, “trama de tragédia grega e a alegria descontrolada do teatro musical”, nas palavras do vocalista Freddie Mercury, sobre quem a cinebiografia, de fato, se detém.
Mas este clássico maior – longe de ser o único do Queen – não é a única justificativa para o filme de Bryan Singer compartilhar seu título. “Rapsódia” era como os gregos antigos chamavam trechos de poemas épicos e hoje define um tipo de composição musical que tem a mistura de ritmos e temas como principal característica. Épico é um adjetivo que se ajusta perfeitamente ao estilo megalômeno de criação, de Mercury em particular, e de todos os Queen em algum grau. E mistura… bem… quem conhece o som sabe como isso tem tudo a ver com os caras. Já “boemia”, no sentido clássico do termo, foi o estilo de vida ao qual Mercury entregou-se de cabeça, segundo o filme tentando anestesiar-se da paradoxal solidão da fama.
A primeira cena já entrega que ele será o foco principal da narrativa. O olhar de Rami Malek, assustadoramente parecido com o do músico, ocupa a tela toda. A câmera vai abrindo e passa a segui-lo até ele se materializar nos bastidores do show que, saberemos mais tarde, será um marco na história do grupo.
Daí em diante a narrativa segue uma ordem cronológica, que começa quando Mercury, Brian May (o guitarrista) e Roger Taylor (baterista) se conhecem – o baixista John Deacon foi o último a subir a bordo. O som de fundo dessa overture é a também fodástica “Somebody To Love”, do disco “A Day At The Races” (1976).
O recorte temporal segue até o tal show para o qual Mercury se prepara nas primeiras cenas. Entre um e outro estão as histórias de seu primeiro e grande amor (hétero), o processo de criação de “Bohemian Rhapsody” (os fãs vão babar), as desavenças entre os membros do grupo e os excessos que levaram o vocalista ao diagnóstico de Aids em um tempo anterior ao coquetel medicamentoso que hoje prolonga a sobrevida dos soropositivos.
Feitos todos os descontos aos resumos inevitáveis – afinal é preciso fazer caber mais de 20 anos em 2h15 de filme -, Bryan Singer saiu-se muito bem na costura da “colcha de retalhos” formada pelas histórias da história de Freddie Mercury e o Queen. Embora o foco mantenha-se o tempo todo no vocalista, as cenas dão conta de destacar, usando detalhes, as principais características de cada integrante: Taylor é o esquentadinho namorador, May o virtuoso disciplinado e Deacon o quieto conciliador. Todos abertos ao experimentalismo e à ousadia, musical e midiática.
O humor é inglês (adoro!). E como em um autêntico filme de fã, a romantização é a tônica. Por isso a narrativa apenas sobrevoa o lado controverso da personalidade de Mercury – os excessos com álcool, sexo e drogas são sutilmente citados, embora muito bem entendidos – e um pouco de equilíbrio se perde nessa simplificação. O que se sobressai é a grandeza do legado musical de Mercury, o que é legítimo, mas eleva-o a uma dimensão menos humana. E o barato de biografias é justamente humanizar os ídolos, mostrando-os com todos os seus defeitos e qualidades. Aqui o fã é levado a relevá-los.
A atuação de Rami Malek, vencedor do Oscar de Melhor Ator pelo papel (também levou o Globo de Ouro), é muitíssimo convincente. No entanto, é preciso desculpar o desconforto que ele demonstra, em algumas cenas, com a prótese que usa na boca para reproduzir a dentição pródiga de Mercury.
Todos os atores estão impressionantemente parecidos com os músicos que interpretam. Fizeram direitinho o dever de casa, imitando trejeitos, modo de falar, tocar, movimentar-se no palco…
E a trilha sonora… ah, a trilha sonora!!! É Queen, né?! Ame ou odeie, indiferente não é possível ficar. Faz o fã sair do cinema direto para o local mais próximo onde possa ouvir os sucessos preferidos da banda no último volume.
Aliás, é o que vou fazer em 3, 2…1.