Produzido para a TV, “Graça e Perdão” (Amish Grace, EUA, 2010) é inspirado no caso real de um pai de família que, amargurado pela perda da filha, decide vingar-se de Deus disparando tiros na escola de uma comunidade Amish e se suicidando em seguida. A morte de cinco das meninas espalha dor entre a comunidade de cristãos ultraconservadores, conhecida por viver isolada do restante da sociedade e cultivar um modo de vida mais primitivo, inclusive com restrições a tecnologias eletrônicas.
Ironicamente, o que acaba chocando a opinião pública, mais do que a brutalidade do crime, é o motivo da visita feita por líderes Amish à viúva do assassino, no mesmo dia do ocorrido. Em meio ao seu próprio luto, eles encontram forças para levar perdão ao atirador e conforto à sua família. Tal desprendimento é considerado tão extraordinário que uma emissora incumbe sua equipe de reportagem de investigar se a comunidade toda concorda com o ato ou se esta está sendo imposto por seus líderes.
Aí entra o paradoxo: que em sociedades majoritariamente cristãs o perdão a quem nos causa dor ou prejuízo é tão inconcebível que provoca incredulidade, choque, descrédito.
E de fato, assistindo ao filme, entendemos a dificuldade de uma das mães que perdeu uma filha em comungar a benevolência para com quem lhe tirou um bem tão precioso. Soa perfeitamente legítimo para nós sua revolta com o marido, que, acredita ela, aceita fácil demais desculpar o assassino da própria filha. “Você está enganada. Não é fácil perdoar”, esclarece ele.
Também para mim foi difícil encontrar lógica nesta postura, até que este questionamento, feito pelo personagem deste pai à filha mais nova, levou-me a pensar: “Não vou castigá-la por odiar, nem vou dizer para não fazê-lo, mas só quero que me responda uma coisa: este ódio… é bom senti-lo?”.
Em outra cena, as famílias prejudicadas pelo episódio recebem atendimento psicológico em um grupo de apoio. A viúva do assassino é a que tem mais dificuldade em perdoar o ato do marido. Ironicamente, são algumas das mães que perderam suas filhas a lhe ensinarem que perdoar não é algo que se faz apenas pelo perdoado, mas também por si mesmo. “Se eu não perdoar todas as vezes do dia em que me lembro e prendo a respiração de ódio, não conseguirei continuar respirando e morrerei aos poucos”, diz uma das mães.
O filme deixa a lição de que somos apenas nós os prejudicados pelo cultivo do ódio, para o qual o único remédio é o perdão. Mas não fornece resposta a uma questão óbvia suscitada pelo paradoxo: por que, vivendo em uma sociedade cristã, o perdão ainda é visto como sinônimo de fraqueza ou de algo abaixo de nossa dignidade? Esta, cada um terá que responder a si mesmo.